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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

DAQUI HÁ 10 ANOS (Diálogo sobre longas e curtas ausências)


O ano talvez seja 2023 e a data uma provável véspera de festas ou feriado. Inesperadamente (mas sempre esperando), me inquieto com o som da campainha numa noite de sexta-feira e, à porta, um de meus filhos chegando em visita:

- A benção pai!
- Deus te abençoe meu filho!
- Um tempinho que eu não vinha te ver Pai!
- Que nada filho, são coisas da vida! (um suspiro raso)
- Mas notei que dessa vez você não SOBRESSALTOU pai!? (risos jovens)
- Verdade filho, não sobressaltei! (alívio idoso)
- Se acostumou, né pai!?!? (Riso jovem amarelado)

- Talvez filho. Acho que aprendi a não sofrer. Troquei uma preocupação por uma curtição, reconhecendo que se a vida te equiparou a mim, era justo me resignar (suspiro de desabafo).

- Mas como papai? A vida jamais me equiparará a você, porque somos indivíduos autônomos e independentes. E não é justo que qualquer filho sobrepuje a história do próprio pai!

- Verdade filho. Mas eu me refiro a superar, valorizar, sobressair. Não me causam mais sobressaltos suas chegadas inesperadas e suas inquietantes ausências.

(Pai discursando e desabafando):

Foram tantas vezes que você saiu sem dizer que iria chegar. Tantas vezes que chegou sem avisar que tinha saído! Tantas vezes tentei lhe questionar sobre suas saídas e suas chegadas, que me perdi nos meus devaneios tolos de Pai. Mas você sempre chegou, ainda que inesperado para os outros e exacerbado para mim. Quantos torpedos, mensagens, emails e ligações investi nas "empresas X" dos teus aeroplanos terrestres!?

Um certo dia, quando me vi inevitavelmente à deriva da tua displicência e, ao mesmo tempo, timoneiro dos teus voos brilhantes, decidi não sofrer nas suas aterrissagens. Pois apesar de querer controlar tuas decolagens, eu lhe concebi com asas.

A despeito de tudo isso, no decorrer do tempo, você chegou ao meu ouvido e disse sorrateiro, em tom de euforia: - Eu me fiz você, e te tornarei igual ao teu pai!

Que momento grandioso você me promulgou com a notícia da sua paternidade! E que salto tríplice, com medalha, me concebeu saltar e premiar na olimpíada da vida! Ao me fazeres avô, percebi que todos os meus medos temeram em vão, e que você venceu as minhas quimeras e minhas angústias!

Eivado da mais pura substância curativa (O AMOR), me pus a debruçar teus filhos nas peripécias das minhas confianças e minhas preferências. E pude perceber que, estando ao lado dos melhores dos teus presentes, a vida não me permitiu mais cobrar o que eu achava ser indelicadeza, inconstância, alienação ou distração de filho.

Mas também me lembrei dos tantos amigos cujos filhos tiveram a vida interrompida por uma viagem, e que nunca se despediram. Nem deixaram netos!

Ao menos pude perceber que cada partida sua foi uma odisseia que meu coração tripulou inquieto, ao seu lado. E que cada chegada sua era uma página nova no capítulo da sua existência, escrita de próprio punho no livro de nossas vidas! Como me sobressaltar diante de uma descoberta tão grandiosa, meu filho!?

- Dá um abraço aqui, nesse seu velho pai!

4 comentários:

  1. Ainda estamos em 2017 mas já consigo ver o seu 2023! Parece tanto com hoje! Beijos lindo texto!
    Ass: TCBoaventura

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    1. Foi assim que eu sonhei Thais. E foi assim que eu escrevi. E talvez seja assim que eu espero. :)

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